PEQUENO CONTO Oito meses, pensou ele, sentado em frente a si próprio, repetia ensurdecedor como o silêncio de Beckett, Oito meses, mastigava as palavras e voltava, Oito meses, e perante si, uma limpeza.
Um dia. Normal como qualquer outro. De repente, um raio de sol mais estranho, mais brilhante que os outros, refracta levemente na janela e entra pelo quarto segurando o pó pelo caminho. Afinal não era um dia normal. Naquele dia, reparou, havia pó. Nos móveis, nos livros, uma camada de tempo pousada em cima das coisas, o pó, apercebeu-se, é uma cápsula de tempo, imóvel, Mostra que nada muda, que nada cresce.
Um dia. Anormal como qualquer outro. Decidiu limpar o pó, Sacudiu retratos, rasgou-os, desafiou espelhos até agora cobertos com panos, viu-se outra vez, à sua frente, A partir de agora, pensou, Só respondo pelo meu outro nome, oito meses de DeLorean num salto para o presente.
Oito meses. Noutro sítio, a ver tudo à distância, há quem volte a ver um nome que diz Fevereiro, Que diz Olá outra vez. Há dias em que ouço uma voz, um tom, uma cadência, e olho para trás. Não é. Olá, outra vez. Lembro-me de ti, era assim que te chamavas. Renascer faz bem de vez em quando. Até amanhã. (Miúdo.)
RC
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